Há muitos modos de fazer poesia. Eu diria mais, diria que há
muitos modos de refazer a poesia, em palavreado e poema, posto que ela já
esteja feita, à disposição, mas rarefeita diante das preocupações do mundo
prático, das necessidades de subsistência, e do mundo aparente. Sendo assim, eu
retifico a frase inicial: há muitos modos de fazer poemas, para refazer a
poesia que está sempre pronta.
Uma das formas é partir de algo importante, pode ser um tema (pessoal
ou universal), um acontecimento, uma experiência (interior, exterior, anterior
ou posterior) e (d)escrevê-lo em imagens e metáforas, em palavras outras, com a
intenção de captar a essência ou lição primordial do tema, acontecimento ou
experiência, buscando a síntese em poucas palavras, ou em muitas palavras deixar-se
levar pelos desdobramentos possíveis de fazer sentido; assim expandindo e/ou
contraindo o ponto inicial de partida: para chegar aonde já desconfiava e
desejava chegar, ou ser surpreendido pelo desenrolar dos significados (que são
donos de si - e de ti, muitas vezes).
Outra maneira é partir de um signo simples, opaco, material,
e extrair dele outros significados, sentidos maiores que ele, histórias contidas,
descobrir sua(s) simbologia(s) e transparências através das figuras de
linguagem, metáforas, hipérboles, comparações... É como tentar pegar o espírito
da coisa, sabe? Tentar dizer o indizível,
ser inaudito. Fingir que algo é inaudito é parte da emoção de descobrir o
óbvio. Tentar dizer o indizível é tentativa e tentação, assim é a escrita
do irresistível.
Há poemas que são dedicados a alguém, como homenagem, e há poemas que só
puderam existir através da existência de determinado alguém e a nós foram
dedicados, para que o escrevêssemos. Há aqueles que são as duas coisas. Há aqueles
puramente inventados, criação pura, vindo do nada. Há as grandes brincadeiras de
sentido e som. Há a descoberta de palavras. Há a revelação de segredos e o
convite dos enigmas. Há as minhas ideias
e há as ideias que se expressam através de mim. Material, imanente ou transcendente,
dependendo do ponto de vista. Escrever assim pode ser um exercício literário e
letra, pode ser uma manifestação do espírito ou a espiritualização de uma
experiência concreta. Pode ser um
insight imediato, pode ser um trabalho artesanal e medido, podem ser as duas
coisas, em ordens diferentes. É bastante coisa, e é preciso organizar. É fluxo
e ordem. É a suspensão da dualidade que
dilacera a existência, é a solução, é maravilha, momento e eternidade que se
pode ver.
Há
muitos modos de fazer poesia, mas a verdade dela já está feita, mesmo quando
rarefeita - assim como eu, ignorante tentando me fazer e já estou feita,
prescrita à liberdade.