domingo, 23 de abril de 2017




Se apagar, acende
Se acender, ascende
Se ascender, assente
Se assentar, aceite a paga, sente.



domingo, 9 de abril de 2017

Miragem



Para Lira Ny






Quero escrever sobre os outros tempos, e assim faço.
Escrevo sob o templo, é assim que faço
E pareço distante, mas estou tão e tão perto
Que sinto apertar.

Estou perto, bem perto da miragem,
Um grande sol aquece a minha cabeça,
Mesmo assim tudo é real, que impaciência.
Estou perto, bem perto da miragem,
Um grande sol aquece a minha cabeça.

Espero, sei, sinto a sede, tremo,
Estou muito, muito perto da miragem,
E a tudo vejo: o real, o rio, o remo.

Desiludida, minhas mãos tocam
A miragem diluída,
Um grande sol aquece a minha sombra,
E já está escrito.


domingo, 2 de abril de 2017

As goiabas

        


        
        
         Diante da goiabeira eu medito à paciência:
         Espero as goiabas caírem, e não as como, nenhuma.
         Vibro de alegria cada vez que uma goiaba vibra no chão
         e não como, nenhuma.
         Goiaba espatifada, eu inteira.
         Nenhuma goiaba me pertence, nenhuma.
         Apenas a maravilha me pertence:
         Eu e a goiabeira a desprender.

         Debaixo da goiabeira eu medito à fé:

         Espero as goiabas não caírem, e não há como,
         elas caem, todas -
         com mais intensidade do que quando eu não estava embaixo dela.
         Quanto mais elas caem, mais eu espero que elas não caiam
         E quanto mais espero que elas não caiam, mais me acertam
         em cheio e me esvaziam:
         Goiabas abertas, eu também.

         Em cima da goiabeira eu não medito:

         Como não sou mais criança, e ainda temo ser mortal 
         Em cima da goiabeira eu ainda não medito,
         olho os pássaros, autorizados a colher as goiabas da leveza,
         aquelas que não caem, e porque anseio 
         o céu encosta-se a mim e (quase) eu não sinto nada.
         É coisa comum, essa de estar abaixo do céu e sentir
         ser um pedaço ao léu, creio.

         Acima de mim, a goiabeira

         Acima da goiabeira, o céu
         Em cima de mim, o véu.
         Em cima da goiabeira eu ainda não medito, 
         Mas pode crer, eu acredito

         Que num dia, distante da goiabeira, eu  meditarei à memória das estações,
         como um trem passado, lento, férreo e cheio de goiabas,
         e lembrarei, já sem dentes, das goiabas cheias de sementes
         e das sementes cheias de goiabas e,
         sem comer, estarei finalmente satisfeita.