quarta-feira, 25 de maio de 2016











Eu mudei tanto e não pude lhe dizer!
Eu era outra, eu estava nova,
Tão nova, tão completamente nova
Que não sabia mais falar.


Deitei no berço do silêncio.
Eu não pude lhe dizer!
Eu não podia ousar a traição de usar a língua velha,
Aquela de tristeza e nojo – explicação! 
Durante as canções de despertar.

Eu não pude lhe dizer!
Nasci em segredo, em segredo vivo.















quinta-feira, 19 de maio de 2016

(Carnaval)

                                                                                                       





As ruas cheias e breves, como a vida, e eu comovida.

Enquanto todo o mundo está lá fora,
Aqui dentro o mundo me toca,
Viola própria, canção. 
Faço festa na casa vazia, celebro exceção,
Meu carnaval não tem hora e
Mora dentro de mim, fora da lei.

Lá fora dança dos imóveis, móveis,
Aqui dentro na companhia dos móveis, imóveis,
Eu canto 
Às casas vazias,
Aos bebês que dormem
(esperando carnavais).
Me divirto ouvindo o silêncio, uníssono e polissêmico, o mundo!

Besouros cegos andando em gatos pardos! Mariposas coloridas, borboletas cinzas! Vagalumes envoltos em bichos da luz envoltos em sombras de morcegos, tonteria, carnaval igual!

A festa é sempre, o caos é sempre, a ordem civil é mentira, senhores, meu carnaval não tem hora, é bíblia rasgada em silêncio eterno, antes lerei as árvores, grandes mitos da natureza, dançarei nas folhas, comerei as frutas, transo o corpo da árvore, o beijo de Deus formiga em mim, carnaval!

O pecado da carne para mim é pouco.  



terça-feira, 3 de maio de 2016

A mordida














O meu corpo era meu, o seu corpo era seu, éramos
Pacotes de almas individuais que respeitavam as linhas do desenho visível, 
Éramos livres, unidos através do invisível.
Nosso amor não era físico - era física:
Pensamento, luz, calor, som e o imponderável quântico da alegria.

Havia eternidade e presença, e quase todas as coisas estavam certas - 
Até que a carne rosa das gengivas nos chamou a atenção.

Até a carne rosa das gengivas nos chamar a atenção
E os dentes enfileirados dos risos virarem mordidas:
Já não nos bastavam as batatas, nem a tranquila carne rosa das goiabas,
Já não nos satisfazia as conversas, nem o andamento do tempo, o brincar:
Era preciso ter domínio sobre a matéria, depressa ocupar o mesmo espaço, agora e já.

A carne é sempre crua?
Nossos olhos não mais boiavam tranquilos no cotidiano
Desde que a carne rosa que segura os dentes, nos chamou a atenção:
Que força é essa imune à gravitação?

Aperta a minha mão, sente a gravidade da fome.